domingo, 28 de junho de 2009

A descoberta do Miniesconderijo de Karnak

No decorrer dos séculos XIX e XX, foram feitas várias descobertas na exploração arqueológica do Egito que chamaram a atenção do mundo para os esplendores da civilização faraônica.
  • a tumba intacta de Tutancâmon, descoberta em 1902 por Howard Carter
  • vasto número de textos que Auguste Mariette recolheu das abóbadas do Serapeum em 1851
  • esconderijo real de Deir el-Bahri, saqueado e depois explorado entre 1875 e 1871
  • escavações espetaculares de Pierre Montet, em Tânis entre 1939 e 1945, uma necrópole real da 21ª e 22ª dinastia, que na maior parte estava intacta

A descoberta do Miniesconderijo de Karnak, por Georges Legrain entre 1903 e 1905, pode ser certamente incluída nessa lista de grande realizações.

Georges Legrain e Gaston Maspero resolveram escavar o pátio do 7º pilone do grande templo de Karnak. Depois de escavar alguns blocos que pertenciam à capela do jubileu de Amenófis I, encontrou-se uma grande laje de alabastro, identificada depois como uma estela de Seti I. Alguns centímetros mais embaixo apareceram 3 magníficas estátuas de tamanho considerável, entre as quais havia uma figura de Amenemhet esculpida em uma pedra verde de cor muito intensa. As primeiras descobertas de uma série que iria continuar por dois anos.

Depois foi descoberta uma escultura do Período Final de um certo Ahmes, filho de Pakharkhonsu, e logo os achados de Legrain formaram uma coleção de esculturas muito rica.

Trabalhando sob condições extremamente difíceis, a equipe recuperou meticulosamente:
  • mais de 700 estátuas
  • 16 mil objetos de bronze e outros numerosos objetos arcaicos
até a escavação ser suspendida em julho de 1905.

Georges Legrain deixou notas preliminares do progresso e do resultado de seu trabalho, se manteve um registro diário de seus achados, o que provavelmente deve ter feito, não foram preservados. Ele escreveu, talvez exagerando um pouco: "Eu estudei cada um deles, copiei e traduzi as inscrições que o cobriam, preparei seu arquivo, sua genealogia e fotografei-os assim que foram descobertos". Se essa documentação realmente existiu, sua perda deveria ser lamentada como uma das maiores calamidades já ocorridas na Egiptologia.

Quando Legrain foi forçado a interromper seu trabalho em julho de 1905 devido ao vazamento de água, ele sabia certamente que o Miniesconderijo ainda não havia mostrado todos os seus segredos. As estátuas que ele recuperou estavam em geral intactas, apesar de algumas terem sido quebradas durante o trabalho de escavação. Teve que tomar medidas severas para evitar ser assoberbado pelo fluxo de objetos que emergiam diariamente. Primeiro um lugar seguro teve de ser encontrado para prevenir os roubos. Apesar de todas as precauções, Legrain não pode evitar que os ladrões levassem, do edifício do Serviço de Antiguidades, 2 das belas estátuas que ele havia descoberto no começo de suas escavações. Mas felizmente os objetos perdidos foram logo recuperados. De acordo com as possibilidades as estátuas eram regularmente enviadas para o Museu Egípcio do Cairo.

A enorme publicidade acerca da descoberta havia despertado demais o interesse dos negociantes de antiguidades, que não poderiam deixar de tentar ganhar algum dinheiro. Algumas estátuas, as de tamanho médio, desapareceram misteriosamente, no transporte ou depois da sua chegada ao museu. Não há praticamente nenhuma coleção na Europa ou nos EUA, que não possua algum objeto do Miniesconderijo. O roubo era sem dúvida a principal causa desta dispersão, independentemente do modo como ocorreu. De que outra forma nós podemos explicar o fato de que, em alguns casos, uma parte de uma estátua está no Museu Egípcio do Cairo e a outra em um museu diferente em algum outro lugar?

Em sua chegada ao Museu do Cairo, os objetos eram registrados, mas as vezes somente depois de uma demora considerável. Nas páginas dedicadas a estes objetos, os números do inventário são normalmente seguidos pela letra "D" que significa, que tal objeto, na maioria estátuas, havia desaparecido. Deve ser enfatizado que nem todas as estátuas foram roubadas. Algumas devem ter atravessado o Salão de Vendas do Museu Egípcio do Cairo, onde antes as autoridades vendiam aos visitantes do museu os objetos que achavam que este já possuía em número suficiente.

Porque o sacerdócio de Karnak depositou em uma cova vasta tantos objetos a ser recuperado; e quando aconteceu esse despacho, que removeu dos templos de Karnak. Independente do motivo e apesar de o fato de nem todos os egiptólogos concordarem, é bastante evidente, a partir das anotações de Legrain, que o Miniesconderijo de Karnak foi montado em uma única ocasião e que os objetos foram depositados de uma maneira bastante fortuita, sem nenhuma ordem cronológica. Não tendo achado nenhuma escultura que considerasse anterior ao século I a.C , Legrain calculou, que o depósito datava do final do período grego, no mais tardar do início do domínio romano.

A descoberta do Miniesconderijo de Karnak é tanto um dos grandes momentos da exploração arqueológica no Egito, quanto o atestado do direito de Georges Legrain na fama eterna. Hoje sua considerável contribuição para a ciência da Egiptologia está clara. O rico acervo de obras de arte que ele salvou do esquecimento mudou profundamente nossa concepção sobre a escultura de Tebas, particularmente no que diz respeito ao estudo dos retratos dos reis.

Poderíamos esperar que o Antigo Império não fosse muito representado em Karnak, mas encontrou-se a parte inferior de uma estátua do rei Neuserre da 5ª dinastia, com um pé a frente; a parte superior desta estátua se encontra no Museu Nacional de Beirute. As figuras reais do Médio Império são mais numerosas, mesmo que limitadas a Senusret I, Senusret III e Amenemhet III, as figuras mais significativas da 12ª dinastia. A maioria de suas estátuas é uma verdadeira obra prima e ilustra o vigor realista característico da escultura real deste período.

Ainda há um longo caminho a ser percorrido antes que o material extraído do Miniesconderijo de Karnak tenha dado toda sua contribuição potencial para o progresso dos estudos da Egiptologia. Mas à luz do que ele já concedeu, nada melhor do que terminarmos com a avaliação entusiástica pronunciada por Gaston Maspero, quando viu as escavações:
"Desde a descoberta do Serapeum por Mariette, ninguém tinha trazido à luz um material de tal importância em um único trabalho".

Texto de Herman De Meulenaere do livro
'Tesouros do Egito' do Museu Egípcio do Cairo


____Algumas peças encontradas no Miniesconderijo de Karnak_____




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Egito

Duas grandes forças: o rio Nilo e o deserto do Saara, configuraram uma das civilizações mais duradoras do mundo. Todos os anos o rio inundava suas margens e depositava uma camada de terra fértil em sua planície aluvial. Os egípcios chamavam a região de Kemet, "terra negra". Esse ciclo fazia prosperar as plantações, abarrotava os celeiros reais e sustentava uma teocracia – encabeçada por um rei de ascendência divina, ou faraó – cujos conceitos básicos se mantiveram inalterados por mais de 3 mil anos. O deserto, por sua vez, atuava como barreira natural, protegendo o Egito das invasões de exércitos e idéias que alteraram  profundamente outras sociedades antigas. O clima seco preservou artefatos como o Grande Papiro Harris, revelando detalhes de uma cultura que ainda hoje suscita admiração.

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