sexta-feira, 27 de março de 2009

Pedra de Roseta

Estranho destino o desta estela: descoberta pelos franceses, mas de propriedade da Inglaterra. Uma estela quebrada, incompleta, que ninguém considera uma obra de arte e que nada tem a ver com as maravilhas legadas pelo Antigo Egito.
A descoberta da pedra de Roseta foi fruto do acaso. Ninguém a procurava ou sabia da sua existência. Encontrada numa fortaleza árabe do século XV d.C., localizada ao lado da cidade de Roseta, no norte do Egito, no braço ocidental do Nilo. Foi batizada de Fort-Julien pelas tropas de Napoleão, que tentava consertá-la quando os otomanos desembarcaram perto dali; em julho de 1799, para expulsá-los do Egito.
De maneira casual, durante os reparos da fortaleza, um jovem oficial, François-Xavier Bouchard, e seus homens acharam a famosa pedra:
  • Um bloco de granito, com pouco mais de um metro de altura, 72 cms de largura e 27 cms de espessura. Pesava 760 quilos. Nunca seria encontrada a parte de cima. O canto inferior direito também se perdeu. Numa das faces, bem polida, estavam gravados três textos, três faixas horizontais, em três escritas diferentes: grego embaixo, hieróglifos em cima, caracteres desconhecidas no meio. Esses caracteres, eram do demótico, uma escrita cursiva do Antigo Egito, simplificação dos hieróglifos.
Como se sabia ler o grego antigo, logo se percebeu tratar-se de um decreto religioso, emitido em honra de um soberano ptolomaico, no século II a.C. No fim do documento, descobriu-se um detalhe importante: o texto deveria ser afixado em todos os templos do Egito, em grego, na língua sagrada (isto é, hieróglifos) e na língua local. Em outras palavras, pela primeira vez dispunha-se de um documento trilíngue. Ou melhor, bilíngue (grego e egípcio) em três escritas.
Ao ver a pedra de Roseta, os oficiais e os estudiosos de Napoleão logo perceberam o tesouro que tinham nas mãos, talvez "a chave dos hieróglifos", segundo Le Courrier de l'Egypte, jornal da Expedição francesa. Os orientalistas fizeram cópias da pedra, tão minunciosas quanto possível, e lançaram-se à tarefa de decifração. Tentaram comparar o texto grego não ao texto hieroglífico, muito incompleto (só conservou parte das 14 últimas linhas), mas ao texto intermediário. Partindo dos nomes próprios do texto grego, procuraram os grupos de sinais correspondentes com a ajuda de um compasso. Infelizmente, não era uma tradução literal. De qualquer modo, esses jovens especialistas não tinham o conhecimento necessário para avançar na decodificação.
A pedra foi deixada de lado e ficou guardada num palácio do Cairo. Foi levada para Alexandria para ser transportada até a França. Mas os ingleses desembarcaram na primavera de 1801 e apossaram-se dela, apesar dos protestos dos franceses. Em Londres, a pedra de Roseta foi incorporada ao Bristish Museum em 1802. Na parte lateral da pedra, escreveram com tinta branca: "Captured in Egypt by the British army" ("confiscada no Egito pelo Exército britânico").
Enviaram cópias às universidades européias, e começou uma corrida à decifração, da qual participaram algumas das melhores cabeças da época. Jean-François Champollion acabou compreendendo que a escrita dos antigos egípcios era ao mesmo figurativa e fonética. A pedra representou um desafio, foi o motor, o ponto de partida de uma das aventuras científicas mais apaixonantes. 
A estela só saiu de Londres uma vez, em 1972, para ser exposta durante algumas semanas no Museu do Louvre, por ocasião do sesquicentenário da decifração dos hieróglifos.
Uma reprodução da pedra está em Figeac, cidade natal de Champollion,numa pequena praça em estilo egípcio, a pedra tem 11 metros por 8,5 metros, e esse lugar chama – Praça das Escritas.
(do Livro 'Egito um olhar amoroso' de Robert Solé, pág 357)

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Egito

Duas grandes forças: o rio Nilo e o deserto do Saara, configuraram uma das civilizações mais duradoras do mundo. Todos os anos o rio inundava suas margens e depositava uma camada de terra fértil em sua planície aluvial. Os egípcios chamavam a região de Kemet, "terra negra". Esse ciclo fazia prosperar as plantações, abarrotava os celeiros reais e sustentava uma teocracia – encabeçada por um rei de ascendência divina, ou faraó – cujos conceitos básicos se mantiveram inalterados por mais de 3 mil anos. O deserto, por sua vez, atuava como barreira natural, protegendo o Egito das invasões de exércitos e idéias que alteraram  profundamente outras sociedades antigas. O clima seco preservou artefatos como o Grande Papiro Harris, revelando detalhes de uma cultura que ainda hoje suscita admiração.

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